Em sua carta, Constituinte Tadeu França, você me pergunta a respeito do papel da Igreja do Brasil durante a mais cruel ditadura militar de nossa história. Passo a responder-lhe, dizendo que a nossa Igreja Cristã-Católica mostrou poucas reações seguras contra torturas, desaparecimentos e mesmo prisões arbitrárias. Destaco um mártir: o jovem frei dominicano Tito de Alencar, que pagou com a própria vida o compromisso de fidelidade pastoral aos perseguidos, depois de ter sido simplesmente destruído nos porões da tortura.
Na Argentina, os principais ditadores foram presos, julgados e condenados.
Em nossa Pátria, os próprios opressores se anistiaram. Os torturadores e assassinos jamais foram presos,julgados e condenados, esquecidos que se fizeram de que o Deus do Amor é o mesmo Deus da Justiça.
Quanto à violência entre os oprimidos, eu a vejo como fruto do desespero.É que a miséria degrada o homem na sua dignidade e o degradado parte para a violência, única e desesperada arma de defesa.
Sim. Acompanhei sempre que possível os familiares dos desaparecidos ao Palácio do Planalto.Ao General Golbery do Couto e Silva entreguei um dossiê sobre os dramas dos familiares em desespero.Sei que não há ninguém na Terra que consiga descrever a dor de quem viu um ente querido desaparecer atrás das grades da cadeia, sem mesmo poder adivinhar o que lhe aconteceu. O desaparecido transforma- se numa sombra que, ao escurecer, se vai encobrindo a última luminosidade da existência terrena.
Recomendo-lhe a leitura do livro: “Brasil: Nunca Mais” por mim prefaciado.
A Igreja é o Povo.
Paulo Evaristo,
Cardeal Arns.